domingo, 15 de maio de 2011

Poemas de Suriel Moisés Ribeiro

Minha Verve

Minha Verve é fagulha migratória
Que ao voar sob as chuvas não cessou
Mas, ergueu flamejante, onde tocou,
A Bandeira Auri-Rubra da vitória.

Velho Engenho que a voz desencantou,
Pelas eras luzindo em trajetória.
Rocha Infante encravada na memória,
Que a serpente dos ventos modelou.

Caranguejo brilhando pela mata
Atraído ao luzeiro cor de prata,
Fogo Vivo ebulido pelo mangue.

Rija Espada a fulgir em dura Pedra,
Tessitura de Raios que alva, medra
Coriscando nas gotas do meu Sangue.


Cabra Castanha

O Ferro ardente e astroso do destino
Gravou raios de Sol em meu costado
Rasgando o véu do negro desatino
Com fino bico, o Gavião dourado.

Agora entendo mais o teu chamado
Clamor que escuto desde pequenino
Em teu pescoço o rastro demarcado
Estrela-Guia ao badalar do sino

E a angústia vil do berro reprimido
Uniu-se à voz de um ventre dolorido
Parindo um canto a mais em teu rebanho

E ainda ungido em sumo de placenta
Busquei teu leite que hoje me alimenta
E herdei teu pelo em meu cantar castanho


Psicografia de um eu lírico inconformado

Sem romper a inércia trivial
Sansarísticamente o céu buscava
Mas achei-me bem longe do ideal
Ao buscar neve em monte: quente lava.

E elegendo-a, pueril denunciava
Mas com isso caí no mesmo mal
E fugia do rumo que firmava
Nesta não-intenção intencional

E ao querer atingir o imprevisível
Mais transbordo o comum e o desprezível
E sem glória meu verso eu mesmo acabo

E por mais que fugir da roda intente
Mais eu giro na roda inconsciente
Que sou cobra a morder meu próprio rabo



Soneto acadêmico

Conheci um demônio enigmático
Vil construto de um ávido intelecto
Que domina de um modo sistemático
Faz de um verso, por rótulos, infecto

Com ardil monta seu esquema tático
Pra engessar em sua fôrma os pensamentos
o dinâmico olhar se faz estático
Nos limites de seus compartimentos

Torna um simples poema tão complexo
Especulando a intenção de quem o cria
Sob a égide da lógica e do nexo

Quem freqüenta uma "nobre" academia
Vê nas mentes o sórdido reflexo
Deste monstro chamado Teoria


Jornada Cultural


Vou cruzar o Brasil de ponta a ponta
Desvendando os mistérios culturais
Dentre as roças sertões e matagais
Vendo a arte que vívida desponta
Pensamento firmado e mala pronta
Vou tirar meu sapato e pôr chinela
E na longa jornada ver quão bela
É a história de cada lugarejo
Descobrindo o talento sertanejo
Onde a luz da cultura se revela

Vou pintar na memória uma aquarela
Com as cores de cada tradição
Traduzir o Brasil com perfeição
Nos detalhes de cada cidadela
Vou a pé, de canoa e barco a vela,
Percorrer cada metro brasileiro
Ver um vate, caboclo, cancioneiro,
Transformar uma opaca pedra bruta
Em diamantes de verso em voz matuta
Como fosse o mais hábil joalheiro

Quero ouvir os segredos do terreiro
Na seara de Obaluaiê
Entregar-me prum coco de Zambê
Numa noite estrelada de janeiro
Com licença de algum catimbozeiro
Ver o culto citado em “Iracema”
E no aroma de arruda e alfazema
Preparar-me pra entrar na sintonia
E entender neste rito a encantaria
Dos augustos mistérios da Jurema

Na procura do Santo diadema
Grande lume sublime Popular
Quero ouvir o mais rústico entoar
Do lirismo caboclo em um poema
Ver o bom cantador que, sem problema,
Improvisa em Martelo Alagoano
Que é complexo, mas ele, sem engano,
Cria versos com toda precisão
Metrifica lirismo e coesão
Humilhando qualquer parnasiano

Vou aos poucos deixar de ser profano
Conhecendo o Sertão dos menestréis
Que sem pompas, canudos nem lauréis
Dão exemplos de honra ao ser humano
O roceiro é artista soberano
Não existe doutor que faça igual
Um poeta, matuto, genial,
Como foi nosso grande Patativa
Uma estrela de luz forte e altiva
Clareando o universo cultural

Quero ver no estilo Armorial
Uma orquestra na beira de uma praia
Com rabeca, com pife, com alfaia
Urucungo, maraca e berimbau.
Quero ver nos festejos de Natal
Um cortejo de vozes tão sofridas
Entoando canções agradecidas
Demonstrando firmeza e confiança
Despertando na gente a esperança
De encontrar alegria em nossas vidas

Quero ver boi de reis nas avenidas
Relembrando o nascido Deus menino
E a brancura da pomba do divino
Contrastando com fitas coloridas
Quero ouvir o compasso das batidas
Sincopadas dum coco e dum baião
E no ardor causticante do verão
Sob a luz das estrelas caminhando
Ver um Boi magistral ressuscitando
No reisado de cada coração

Quero ver a folia do azulão,
Do nhambu, do xexéu, numa toada
Floreando o prelúdio d’alvorada
Quando o Sol vem rompendo a escuridão
Sob a luz matutina do Sertão
Ver a mata florindo bela e pura
Que, com toda abundancia, configura
Um cenário pra grande sinfonia
Dos canários cantando de alegria
Em louvor aos caprichos da Natura

Quero ver a mais mítica figura
Das histórias do velho pai Vicente
O saci viciado em aguardente
E a mula assombrando a noite escura
Boitatá a terrível criatura
Curupira cuidando o florestal
E um índio de encanto sem igual
Que tocava uma flauta de bambu
Num mistério virar uirapuru
Passarinho de canto divinal

Nesta grande jornada cultural
Vou findar esta sede que maltrata
Na mais limpa nascente que hidrata
A raiz do folclore nacional
Vou lavar o nojento lamaçal
Tão bizarro da “arte” de hoje em dia
Que desponta na rádio ou livraria
No pagode, no funk ou no congresso
De doutores que estudam prosa e verso,
Com a mesma pseudo-poesia

Vou pedir toda força e valentia
Necessárias na intrépida batalha
Pra transpor com bravura a vil muralha
Do modismo e da vã idolatria
Vou mostrar o valor da poesia
Que a própria natura nos retrata
Que não veio de um meio aristocrata
Nem de um grupo, de doutos, influente
Mas brotou e cresceu como a semente
De um ipê que ornamenta a verde mata

Já me usei de linguagem abstrata
Inspirado no estilo modernista
Mas é quando eu escuto um Repentista
Que a minha poética desata
Repentista parece uma cascata
Conduzindo lirismo em correnteza
No seu metro descreve com riqueza
O mais belo cantar dos rouxinóis
Construindo sublimes arrebóis
Em seu canto louvando a natureza

Vou saudar estes Mestres da destreza
Portadores da herança milenar
Cujo tempo cuidou de preservar
Desde as eras feudais da realeza
Que através das esquadras, portuguesa,
Holandesa, francesa e espanhola
Conduziram no mar a grande escola
Pra formar novos bardos com virtude
E trocar o nostálgico alaúde
Pelos fortes ponteios da viola

Como gira no espaço a grande bola
Nos etéreos confins da imensidão
Vou rodar o país nesta função
Pra matar a vontade que me assola
Ver os grandes concursos de viola
Transbordando em talento e maestria
E no afã da instigante cantoria
Contemplando o maior dos espetáculos
Alcançar a planície nos pináculos
Consagrados da Santa Poesia

4 comentários:

  1. Oi colega poeta, não nos conhecemos pessoalmente, uma pena. Parabéns, teus poemas são muito bons, ana mariano

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  2. Bom demais, Suriel! Ouvi-lo em Jornada Cultural foi emocionante.

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  3. Suriel, muito bons! Como a Fabi gostei muito de te ver falar a Jornada Cultural. De fato, foi emocionante.

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  4. Caro Suriel Moises Ribeiro.
    dia 26-10-2015, enviei-lhe um e-mail com 2 anexos (5+24 páginas)
    (..., e, para o seu colega Rafael Trombetta, também)

    - É um convite ao Suriel Moises, para desbravar o Brasil / Europa, que existe em cada um de NÓS, aceita? - Quer publicar os dois anexos que lhe enviei?

    Geo abraço

    Roberto Moreno
    Skype: geolingua

    Cá está, um pouquinho de mim - http://www.youtube.com/watch?v=aisI7SEry4c

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